O Brasil pode aprovar o plantio de sementes estéreis!

O pavio, na coluna Ciência e Sociedade, sistematicamente denuncia  à ação irresponsável das agroindústrias e das empresas que produzem tecnologia transgênica. Nosso objetivo é ampliar o debate sobre que tipo de ciência e biotecnologia é desenvolvida no país, que na maioria das vezes coloca acima do interesse público os benefícios privados.

Os grupos empresariais ligados ao agronegócio colocam à sua disposição a aprovação de políticas públicas que agridem a saúde ambiental e, principalmente, a saúde dos pequenos agricultores. Estes trabalhadores, que são sobreviventes do massacre promovido pela agroindústria cotidianamente, tentam lutar contra os constantes atentados da bancada ruralista que, cada vez mais, ganha força e poder em Brasília.

A notícia que trazemos hoje, que também podemos intitular como denúncia, mostra mais uma vez as garras destas poderosas corporações. Sem mobilização social e nem muita divulgação internacional, será difícil barrar esta nova ameaça para a biodiversidade e os pequenos agricultores: estamos muito próximos de sermos o primeiro país a aprovar o cultivo das sementes “terminator” – leia o artigo na íntegra abaixo.

Algumas perguntas, em relação à comunidade científica organizada, também devem ser feitas, por exemplo: Qual é o posicionamento das sociedades científicas brasileiras? Quando vão se manifestar? Por que não se manifestam?

Vários movimentos sociais organizaram um abaixo assinado.

Assine aqui: https://www.change.org/p/diga-n%C3%A3o-aos-exterminadores-de-sementes-contra-o-projeto-de-lei-268-2007-no-brasil?recruiter=422667810&utm_source=share_petition&utm_medium=copylink

Imagem: http://pratoslimpos.org.br/?tag=terminator

Brasil pode ser o primeiro País a liberar semente Terminator

Projeto de lei avança no Congresso e pode disseminar sementes propositalmente estéreis produzidas por multinacionais
Grupos de lobby costumam se aproveitar de governos enfraquecidos, e o Brasil não é exceção. Em meio à atual crise política, a bancada ruralista no Congresso se movimenta para aprovar um projeto de lei que modificaria a Lei de Biossegurança. Se aprovado, o PL 1117 fará do Brasil o primeiro país no mundo a legislar em favor do cultivo comercial de plantas propositalmente estéreis, afrouxando a proibição às chamadas sementes Terminator.

Ambientalistas acreditam que o PL, hoje avançando no Congresso com pouca discussão, representa uma das maiores ameaças de todos os tempos à biodiversidade brasileira.

A intenção da bancada ruralista não é nova. Desde a aprovação da Lei de Biossegurança em 2005 esses parlamentares tentam liberar o cultivo de plantas Terminator. A diferença desta terceira tentativa é que nunca as chances de aprovação foram tão grandes.

O filho da ministra de Agricultura, Kátia Abreu, Irajá Abreu (PSD-TO) apresentou o primeiro projeto de lei em 2005 e hoje comanda a Comissão de Agricultura da Câmara dos Deputados. É nesta comissão que Alceu Moreira (PMDB-RS) apresentou o novo texto.

Gerson Teixeira, especialista em desenvolvimento agrícola e crítico da iniciativa, vê poucas chances de obstruir a aprovação: “a bancada ruralista tem um céu de brigadeiro à sua frente”.

Muito parecido com os dois anteriores, o novo PL reduz a proibição das Tecnologias Genéticas de Restrições de Uso, as GURTs, comumente chamadas de Terminator. Tratam-se de sementes transgênicas modificadas para se tornarem estéreis a partir da segunda geração.

O projeto libera essas sementes nos casos de “plantas biorreatoras” ou plantas que possam ser “multiplicadas vegetativamente”. Plantas biorreatoras incluem qualquer planta modificada geneticamente para uso industrial — por exemplo, para a indústria farmacêutica ou para a produção de biocombustíveis.

Plantas “multiplicadas vegetativamente” são aquelas que se reproduzem assexualmente. Essas exceções irão permitir o uso de espécies estéreis no cultivo de algumas das lavouras principais no Brasil, como cana-de-açúcar e eucalipto.

As sementes seriam também liberadas para o cultivo de plantas consideradas “benéficas para a biossegurança”. Essa linguagem vaga introduz outra brecha interessante aos produtores das sementes transgênicas. Caberia a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), onde a bancada ruralista goza de boa influência, a decisão sobre o que é “benéfico para a biossegurança”.

Ambientalistas preocupados

Os defensores dizem que essas sementes são seguras, porque as suas próprias caraterísticas, sobretudo a sua esterilidade, impediriam a sua disseminação. Os ambientalistas não concordam.

Segundo Silvia Ribeiro, diretora para América Latina do ECT (Grupo de Ação sobre Erosão, Tecnologia e Concentração), uma organização internacional de estudos ambientais e socioeconômicos, “existem relatórios científicos indicando que as GURTs não funcionarão como prometido e implicam em novos riscos”.

A EcoNexus, instituição britânica que investiga esse tipo de sementes desde 1998, não está convencida de que as Terminators não causarão contaminação.

O fato de estas sementes terem passado por modificações genéticas para serem estéreis traz preocupação quanto às consequências de uma introdução no ecossistema. Em um cenário ruim, o gene Terminator poderia se espalhar de forma imprevisível pelo Brasil, ameaçando inclusive biomas como o da Amazônia

Teixeira é pessimista quando ao possível efeito: “essas sementes podem levar a um armagedom da agricultura brasileira”.

Mais gastos para agricultores

Se a esterilidade das plantas se generalizar, haverá ainda consequências econômicas para os agricultores brasileiros, particularmente os pequenos. No momento, os produtores guardam sementes de quase dois-terços dos seus cultivos para plantar no ano seguinte, reduzindo consideravelmente os seus custos.

Com o uso de sementes estéreis, há a obrigação de se comprar novas sementes todo ano.

Citando o exemplo do milho, Teixeira calcula que os agricultores brasileiros teriam que pagar R$ 1,17 bilhões por ano na compra de novas sementes, comparado ao desembolso atual de R$ 162 milhões.

Quem ganha com esse extra é o mercado de sementes, hoje dominado por multinacionais. Segundo Darci Frigo, advogado da organização socioambiental Terra de Direitos, “as multinacionais compraram praticamente todas as pequenas e médias empresas de sementes. Elas dominam a cadeia alimentar desde a produção de sementes, fertilizantes e pesticidas até a logística, transporte e exportação. Os agricultores são totalmente subordinados a esses grupos.”

Os chamados “big six” – Monsanto, Dupont e Dow (EUA), Syngenta (Suíça) e as alemãs Basf e Bayer – introduziram todos os transgênicos autorizados para cultivo comercial no Brasil.  A única empresa brasileira no setor é a estatal Embrapa.

Gerson Teixeira acredita que as multinacionais estão por trás do movimento em prol da aprovação do PL, uma vez que elas ganhariam uma espécie de “patente biológica” impedindo os agricultores de guardar as suas sementes – forçando as novas compras a cada ano.

COP 21

Em 2000, os 192 países signatários da Convenção sobre Diversidade Biológica – um tratado internacional que reconhece que a conservação da diversidade biológica é uma “preocupação comum da humanidade” – impuseram uma moratória sobre as Terminator. As empresas de biotecnologia se comprometeram a não comercializá-las.

A aprovação na Comissāo de Agricultura é só o primeiro passo. O que pode dificultar o lobby da bancada ruralista é a Conferência do Clima em Paris em dezembro. O Brasil deve apresentar seu sucesso em reduzir o desmatamento na Amazônia. O prestígio internacional vindo com este avanço, no entanto, poderia ser ofuscado pela eventual censura internacional caso o País se torne o primeiro do mundo a dar o sinal verdade para as Terminator.

Artigo publicado na Carta Capital: http://www.cartacapital.com.br/sustentabilidade/brasil-pode-ser-o-primeiro-pais-a-liberar-semente-terminator-9110.html

Artigo Versão em inglês: http://news.mongabay.com/2015/10/brazil-poised-to-break-global-moratorium-on-gm-terminator-seeds/

Sobre a autora:  A jornalista inglesa Sue Branford foi editora para a América Latina da BBC e correspondente do Guardian em São Paulo (Fonte: Carta Capital).