A contramão de toda América Latina, Brasil teve aumento no número de infecções por HIV
Em nota divulgada no sábado, a Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS aponta a expansão do conservadorismo no país, que tem fortalecido estigmas e preconceitos, como uma das causas do aumento no número de infecções por HIV a contramão do que aconteceu na região: na América Latina houve uma diminuição do 3% de infecções e no Brasil um aumento de 11%.
ABIA responsabiliza perda da ousadia na resposta brasileira pelo aumento de infecções por HIV no país
A Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS (ABIA) credita a expansão do conservadorismo no país como um dos fatores principais que vem causando o aumento de novas infecções no Brasil. Segundo relatório divulgado pelo Programa Conjunto das Nações Unidas sobre o HIV e a AIDS (Unaids, sigla em inglês) houve no país um crescimento de 11% de infecções no período de 2005 a 2013.
A Unaids trouxe visibilidade a algo que as organizações da sociedade civil tem documentado e denunciado há algum tempo. Há pelo menos três anos, a ABIA tem alertado que o fortalecimento das barreiras impostas à participação de organizações civis e das comunidades afetadas na construção de respostas à epidemia resultaria em conseqüências negativas ao Brasil.
As ações do governo brasileiro tem fortalecido estigmas e preconceitos que violam os direitos humanos de grupos e populações afetados pelo HIV e AIDS. O veto à campanha do carnaval em 2012 – em que um vídeo voltado para população gay foi substituído por um material distante da realidade dos jovens, o público-alvo da campanha – foi um dos sinais deste retrocesso no enfrentamento à epidemia.
Outra ação desastrosa ocorreu em junho do ano passado quando a campanha destinada às\aos profissionais do sexo foi vetada por apresentar conteúdo afirmativo contra a discriminação. Tais censuras, associadas à imposição de políticas prontas que violam o respeito às subjetividades individuais e coletivas, retratam a perda da ousadia da resposta brasileira à AIDS.
É inadmissível que um país, outrora reconhecido como uma experiência de ponta no combate à AIDS no mundo, esteja na contramão da tendência global de queda de mortes e infecção pela doença.
Alertamos que nenhuma política será eficaz se não confrontar o preconceito, a estigmatização e a discriminação. Esses fatores dificultam o acesso à prevenção e ao tratamento, geram medo, desconfiança e produzem mortes causadas pela doença.
Insistimos que uma política de AIDS deve estar baseada nos princípios dos direitos humanos e considerar as especificidades das populações mais afetadas, com destaque para os jovens e gays. Reforçamos ser imprescindível para as populações em situação de vulnerabilidade o acesso igualitário à atenção básica do SUS e aos medicamentos.
As estimativas da Unaids – que preveem o controle da epidemia no mundo até 2030 – podem renovar as esperanças internacionais. Mas lembramos que só serão alcançadas se os governos, sobretudo onde as taxas de infecção estão crescentes, forem capazes de adotar pelo menos duas medidas emergenciais: 1) estancar a onda conservadora na construção de respostas à AIDS e 2) implementar ou retomar a agenda de discussão ampliada entre gestores, pesquisadores e sociedade civil.
Por fim, alertamos que este dever de casa deve começar imediatamente.
Rio de janeiro, 18 de julho de 2014